quinta-feira, 13 de dezembro de 2012



Tudo é culpa do Oswaldo!

        Cheguei à portaria do meu prédio às três e meia da manhã. Confesso que em estado pouco comunicativo. Porém, seguindo a cartilha de qualquer bom lorde inglês nascido em Taubaté, deferi o cotidiano “boa noite” ao porteiro. Este, como qualquer bom ser solitário da madrugada, retrucou a mesma frase, no entanto com entusiasmo carnavalesco. Enquanto esperava o elevador, não pude deixar de pensar na carência humana exaltado a partir de um simples comprimento social básico. Ébrio, perguntei:
        -Zé, como vai seu time de pelada? – ele jogava num escrete de várzea. Feliz como um cão recém-chegado à uma barraquinha de cachorro-quente, responde:
     -Eles são muito ruins; Eu tenho que jogar no ataque, na defesa, no meio-de-campo e até na lateral.
    O elevador chegou. Inquieto mentalmente, não pude deixar de refletir sobre o tamanho de tal audácia futebolística. Como um dito jogador pode chamar outro de ruim se ele próprio não tem posição fixa? Não obtendo alguma conclusão interessante, fumei o último cigarro e dormi.
     Semanas se passaram até que um dia eu fui jogar bola no Aterro. No decorrer da partida, observo se aproximando das dimensões do campo ele, o Zé camisa 39. Curioso como sempre, permaneço após o jogo para assistir aquele camaleão futebolístico em ação.
        Ele começou jogando na trincheira, atuando feito um Fábio Ferreira. Para os leigos, era um porco prestes a ser abatido. Por tanto medo de perder a vida, ou tomar um drible, não pensava em outra coisa a não ser destroçar o adversário; ou o abatedor. Conforme o jogo seguiu, o atacante de “ofício”, detentor de um polvoroso espírito com capacidades físicas pouco correspondentes, pediu arrego e esbravejou:
        -Zé, troca de posição?
        E o craque, sem emitir um único som, começou sua cruzada individual à margem oposta, semelhando um príncipe dinamarquês em dia de casório. Passaram-se cinco, dez, quinze minutos e nada. Faltava um Gérson no meio-de-campo. Ou um cometa. Mas eis que, vinte minutos após a troca de posição, Zé domina a bola na marca do pênalti. Sem adversários próximos, apenas o goleiro, ele tenta ajeitar a danada, mas ela é rebelde. Mesmo assim, ele avança em direção ao gol. O goleiro cresce em sua frente, apesar de ter altura de um Hobbit. (trocadilho ridículo, eu sei). Zé finge que não vai, e vai. Finge que vai, e vai. Arquiteta um chute assassino e o goleiro rouba a pelota de seus pés. Fim de jogo. 1 a 0 para o outro time.
    Você pode estar se perguntando qual é a moral da história, afinal. Responderei, antes de qualquer balela, que esta é mais uma de muitas curiosidades infames e mesquinhas que um leitor pode ter. No entanto, como vossa vontade não impera sobre minha escrita, faço questão de explicar-lhes. Botafoguenses, cuidado! O Oswaldo continuará blasfemando nosso clube aos quatro ventos. Porém, como não me é de costume, peço-vos que não o apedreje. Ele não sabe o mal que nos faz, tão pouco as besteiras que diz. Se ele diz que futebol moderno não precisa de atacante de origem, eu digo que ele não entende quatro coisas na própria fala: O significado de atacante, de origem, de futebol e, muito menos, de modernidade.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012




Cinema, Freixo e a Revolução Egípcia (ou Quando os Elefantes vão à Guerra até a Grama Sofre)


        Ainda surpreendo-me com a capacidade de transformação/transmissão de uma sala de cinema. Não saberia afirmar, exatamente, quantas vezes tive esta sensação, mas posso afirmar que uma renovação, principalmente ideológica, sempre é benigna. Assisti o debate da Record na terça e ontem fui, pela primeira vez este ano, ao Festival do Rio. A princípio, aos olhos de qualquer vago leitor, tais recortes pouco têm haver entre si. Pois bem, surpreenda-se também.

Os filmes assistidos foram “Documentando... Uma Revolução”, sobre a Revolução Egípcia, e “Síria, Arrebentando no Ponto mais Fraco”. Confesso, desde já, que há muito não me emocionava tanto no cinema. Foi maravilhoso ver dois povos lutarem por causas tão latentes no mundo atual com uma raiva furiosamente jovem, sempre contadas por um ponto de vista pouco convencional em nossos meios televisivos. Civis, alguns desarmados outros nem tanto, esbravejando que morreriam por uma causa maior, a liberdade de seus semelhantes. E acreditem, pela primeira vez ouvi esta frase e ela não me soou fascista. Eles realmente acreditavam no bem-estar do próximo e das próximas gerações. Eles realmente acreditavam que tinha chegado a hora de lutar. Eles realmente acreditavam que nada deveria parecer impossível de mudar, apesar de muitas coisas nunca terem. Tudo isso a partir de um meio de comunicação revolucionário: este meio que vos transmito minha singela opinião.
       
        Voltando para o Rio de Janeiro, que pela primeira vez em sua história foi diminuído em apenas um pelo Dudu, chegamos a Marcelo Freixo. Não tão primeiramente assim, mas ainda sendo válido, quero frisar que até ontem meu voto seria nulo. Não confio em político algum e, muito menos, nesta máquina política taxada, rudimentarmente e demagogamente, de democrática. Mas todos devem ser tangíveis a mudanças, e abrir a própria cabeça às vezes se faz necessário. Porém, sempre deixar de querer o impossível para algo mais recorrente traz menos sofrimento. E eu amadureci na primavera carioca, exatamente após uma cena do filme “Documentando...”.

        Com a Praça Tahrir já dominado pelo povo egípcio, após batalhas homéricas em 18 dias de confrontos, todos os expoentes da terceira civilização que mais me agrada historicamente estavam sedentos pelo anúncio oficial da renúncia do presidente. Este pede o microfone de fala: “Eu também tenho filhos e acreditem, eu também já fui jovem como vocês”. A cena é cortada para uma entrevista com uma ativista que diz, categoricamente: “Eu não posso afirmar se ele já foi jovem, porém posso garantir-lhes que nunca foi como nós”. Esta ênfase, quase que arrogante, faltava ao jovem. Mas já não falta mais. A cena volta para a Praça Tahrir, mostrando o povo caminhando em direção ao palácio presidencial. Após cercado, o presidente enfim renuncia convencido de suas próprias limitações. Depois é pura literatura. Fez-se o carnaval fora de época. Festa muito mais comemorada, pela simples razão de ter motivos para tal. A liberdade não lhes bateu a porta. Eles a escacharam antes de ela poder pronunciar suas últimas palavras. Agora eles a controlariam, ninguém mais. Enfim, a juventude chegava ao poder. Sem lideres. Sem princípios. Sem ambição de domínio. Apenas a demonstração da força de um povo. Apenas a demonstração de um povo.

A partir dali entendi a campanha do Freixo. Um adversário que tem 17 minutos de campanha eleitoral em comparação aos 13 de todos os outros candidatos juntos não pode ser taxado como democrático. Todos sabem pelo histórico do PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) que este nunca teve ambição alguma de, sequer, fazer jus ao próprio nome. A hora de mostrar o que este câncer político brasileiro representa é agora.

O Segundo turno seria de uma avalanche desmoralizante que, talvez, faria com que todos os candidatos repensarem suas campanhas daqui pra frente. Meus caros, seria com muito prazer que afirmaria ver o conteúdo ultrapassar a forma. O que a internet representa para a comunicação do indivíduo jamais poderia ficar fora de uma conversa eleitoral/política. E Freixo a utilizou com louvor, funcionalmente e semanticamente falando.

Havendo segundo turno ou não, gostaria de deixar registrado que esta foi a maior campanha eleitoral que já vivenciei, e agradecer ao Marcelinho por ter levado tantos jovens, não só a crer na mudança política, mas, principalmente, por ter-lhes dado prazer em discuti-la. Mcluhan afirmou que o meio é a mensagem, mas ele não vivenciou a virtualidade de nossa época. Eu, carlitianamente como sempre, afirmo que o meio é a revolução e grito: “Uh, é o Freixo; Uh, é o Freixo”.

terça-feira, 18 de setembro de 2012




Porque o Botafogo contribuiu para a Tropicália?


  Fui abduzido a assistir “Tropicália” e posso afirmar-lhes com toda a segurança que este é um baita documentário. Não apenas por seus depoimentos e vídeos históricos, mas principalmente por ter uma estética arrojada e uma narrativa envolvente. Um filme emocionante para todos aqueles que veem no movimento um sopro de liberdade artística misturada com uma inalação de tudo o que pode ser considerado tenro, bento, severo, divino e maravilhoso.
       
     Porém, não pude deixar de sentir falta, vendo tantos meios de campos, dos artistas da estrela solitária. Afinal, futebol também é uma manifestação cultural. Afirmo, sem desvios freudianos, que a bandeira gloriosa é um símbolo de marginalidade e heroísmo muito mais eloquente que qualquer obra do Oiticica. E meus caros, o Solar da Fossa era vizinho de General Severiano, e isto não foi conjecturado coincidentemente. Ou foi? Sigo afirmando que nenhum outro clube no mundo pode ser considerado tão tropicalista quanto o Botafogo. Por quê?

 Prezados amigos, junte a malandragem de um Garrincha, a inteligência de um Gérson, uma poética retórica de um Neném Prancha, um protestantismo de um Afonsinho e um rancor, eternamente juvenil, de um João Saldanha que você terá o mais puro conjunto de insanidade já visto. Eles são os verdadeiros mutantes alquimistas do cosmo tropical latino-americano. Sem estes, envoltos em um manto místico de proteção amedrontadora, os músicos, cineastas e artistas plásticos não teriam inspiração criativa nem para ir até a padaria.

   Assim como o movimento sempre foi contrário ao rótulo de MPB, nós também sempre haveremos de ser contrários ao rótulo de time popular. Para coroar esta didática, hoje completam exatos quarenta e quatro anos da histórica final da Taça Guanabara. Aquela que fez adormecer a maioria dos carentes; E que fez enlouquecer os bons da cabeça e sedentos do pé.

        Salve a bossa, sa, sa!
        Salve a Ypióca, ca, ca, ca, ca!

segunda-feira, 3 de setembro de 2012



      Peço-lhes 5 minutos de vossas atenções para dizer o que penso. Ou pensava. Ou pensarei. Não sei. Nem o tempo dirá.


O Clássico Engano de Tempo
      

Levantei-me da cadeira, após mais um fracasso revestido pelo resultado, e me direcionei à rampa de saída. Como de costume, caminhei sem prestar atenção em qualquer comentário despretensioso sobre o jogo. Sumariamente, alguém encosta em meu ombro. Por azar, era um amigo querendo conversar. Também pouco iludido pelo placar, pergunta-me o que tinha achado do time. Respondo-lhe que como estávamos em tempos de para-olimpíadas, até que tinha sido agradável. Os moralistas que me desculpem, mas não assisto essa competição. Sinto-me mal ver um cara sem pernas e braços nadar melhor que eu. Não sou contra a transmissão delas e tanto pouco sua existência. Apenas não assisto. Sem compreender minha resposta, meu amigo “complementa”:

        -É, esse time precisa de tempo.

      Aumento o passo do Lui e saio sem coragem de despedida. Aquela última palavra me é muito perturbadora. Tempo. Tempo. Tempo. Vamos ficar um tempo sem nos ver. O tempo responderá. O melhor remédio é o tempo. Mentira. Afirmo e explico daqui a 3 minutos que essa é a desculpa mais coringa e fiada que existe.

        Antigamente, quando algum esquete ia mal, os menos sensíveis diziam que era culpa do técnico, do jogador, da bola, do aquecimento global, da França, da gripe suína ou até mesmo da cerveja nos estádios. Mas as coisas mudaram, e em tempos de complexos de Bóson, os nossos piores inimigos ainda são os relógios e os calendários.
       
        Meus caros, a solução não virá com o tempo. Virá com mudanças, conversas, desistências esclarecidas e aceitações dubitáveis. Palavras como pausa, calma e espera nada são além de aliados do tempo. Quiçá sinônimos. O tempo não para? É obvio que não! Ele é a pausa. Esse intervalo que tanto me dá desgosto e preocupação. Quem nunca quis dormir e acordar três anos depois, ou antes, que atira a primeira pedra.

Esse time, minha vida, sua vida, nada mudará com o tempo. Mudarão com reclamações, brigas e, porque não, conclusões. Aguardemos os próximos dias...
            


quinta-feira, 23 de agosto de 2012




O Deus de Carlito Rocha
Por Nelson Rodrigues, Manchete, 04/01/1958


“Chegou, enfim, o momento de fazer de Carlito Rocha o meu personagem da semana. Quer queiram, quer não, ele está atrelado ao fabuloso triunfo alvinegro sobre o Fluminense. E aqui pergunto: Qual teria sido a contribuição carlitiana para o título? E eu próprio respondo: Carlito ligou o jogo ao sobrenatural, pôs Deus ao lado do Botafogo e, mais do que isso, pôs Deus contra o Fluminense.

E, com efeito, três ou quatro dias antes do clássico, um jornalista foi provocar o velho Rocha. Ora, o Carlito nunca teve meias medidas, nunca! Bastaram duas ou três perguntas estimulantes para que dentro dele rugisse a imortal paixão botafoguense. Disse ele que Deus viera anunciar-lhe a vitória do Botafogo Um vaticínio divino é algo mais do que um palpite de esquina. No entanto, vejam vocês, nem o jornal que publicou a reportagem, nem o leitor, nem a torcida, ninguém acreditou nem em Carlito, nem na visão, nem mesmo em Deus. As declarações do velho Rocha, tão honestas e incisivas, pareceram a nós, impotentes da fé, uma simples e cruel piada de jornal. E um amigo, pó-de-arroz como eu, veio perguntar-me: ‘Viste o Deus de Carlito?’ Eu não tinha visto o jornal ainda, mas as palavras do meu amigo ficaram ressoantes em mim. ‘Deus de Carlito...’ E, subitamente, eu compreendi o seguinte: não há um Deus geral, não há um Deus de todos, não há um Deus para todos. O que existe, sim, é o Deus de cada um, um Deus para cada um. Por outras palavras, um Deus de Carlito, um Deus do leitor, um Deus meu e assim por diante. Graças ao Carlito criava-se uma relação entre o Botafogo e o sobrenatural e o clássico decisivo passava a adquirir um pouco de eternidade.

Veio o jogo. Com a nossa impetuosidade tínhamos da batalha uma visão crassamente realista: só cuidávamos dos aspectos técnicos, tácticos e físicos. Eu próprio vivia perguntando, a um e a outro, na minha aflição de pó-de-arroz: O Leo joga? O Leo não joga? Em suma, pensava em Leo, em Pinheiro, em Cacá ou Valdo. Mas não chamava o meu Deus. Ao passo que o velho Rocha sabe o quanto acrescenta a qualquer pelada do Botafogo a dimensão da sua fé. Eu não vi, nem ouvi, durante toda a semana do jogo, um tricolor falar em Deus. E porquê? Pelo seguinte: achamos que Deus não se interessa por futebol, portanto, nós o excluímos das atribuições da nossa torcida. Domingo nunca houve um clube tão sem Deus como o Fluminense. Ora, nenhum brasileiro consegue ser nada, no futebol ou fora dele, sem a sua medalhinha de pescoço, sem os seus santinhos, sem as suas promessas, e numa palavra, sem o seu Deus pessoal e intransferível. É esse místico arsenal que explica as vitórias esmagadoras. Portanto, os motivos, eu acredito piamente, na contribuição de Carlito para o perfeito, o irretocável triunfo alvinegro. E de resto, como não gostar do Deus do velho Rocha? Deus tão cordial, íntimo, terno, que se incorporou à torcida botafoguense e viveu com a torcida botafoguense aqueles eternos noventa minutos.”

quarta-feira, 15 de agosto de 2012




Neymar Neybom, Apenas Ney
 
            Gostaria de começar frisando que não tenho pudor algum de afirmar que este esquete passou vexame nas Olimpíadas. Vexame. “Ora pois, o brasileiro têm que aprender a valorizar a prata e o segundo lugar!”, esbraveja o padeiro vascaíno da esquina. Segundo lugar não me interessa, muito menos para com o esquete nacional. Utilizo o termo esquete nacional porque esta jamais será a seleção brasileira. Afirmo e já explico que esse time, tanto por culpa deste técnico como do anterior, está fadado a desmoralizar nosso país na próxima Copa.
           
Talvez, algum ser mais evoluído e superior possa me esclarecer e me acalmar com frases do tipo: esta esquete olímpica foi sub-23; tivemos azar no último jogo; jogando em casa, nós não deixaremos esta taça escapar. Confesso que todo tipo de argumentação otimista me deixa mais enraivado do que qualquer outra blasfêmia. O otimismo cega e degenera as pessoas.

É inadmissível que um esquete nacional se baseie em apenas um jogador, seja este quem for. Poderia ser o Inri Cristo que eu continuaria com a retaliação. Porém, para nossa sorte ou não, este jogador não tem nome bíblico. Ao menos, não ainda. E este ser, no auge dos seus 20 anos, realmente acredita que é maior que todo o resto junto. Meu pouco amigo Ney, com este cabelo você não é nem maior do que um rodo e um frasco de lustra-móveis. Se liga, faz uma colônia de férias, curte a vida, passa o carnaval em Salvador e volta pra 2018. Estaremos te esperando.
           
Realmente acredito que ele deveria ter sido banco na última Copa, juntamente com o Ganso. Creio piamente que isto lhe traria maturidade e noção do que é representar seu país, coisas que a ele são carentes. Mas não foi e quem lamenta o passado é filho de coveiro. No entanto, continuo com o perfil fatalista de que nunca é tarde para terminar de estragar as coisas.

            Estas coisas me fazem lembrar de uma lenda urbana futicabalística. Nos primórdios de sua carreira profissional, um jornalista muito letrado foi escolhido para cobrir um jogo do Santos no Maranhão. Porém, chegando ao estádio, descobriu que não tinha autorização para fazê-lo do campo. Apesar de toda a insegurança de um jornalista pré-fabricado, comprou um ingresso na vaga esperança de conseguir escrever uma matéria de lá. Escolheu um lugar pouco povoado, sentou-se, pegou o caderninho e esperou o jogo começar. Faltando cinco minutos para a batalha ter início, avistou nas proximidades um ser que lhe era conhecido. Automaticamente, pensou: “Agora sim. Uma entrevista exclusiva. Vou dessa pra melhor”. De fato, não estava de todo enganado. Sentou-se ao lado do sujeito e esbravejou:
           
-O senhor é o pai do Neymar?

            Meio a contragosto, meio tímido, respondeu:

            -Sim, sou.

            Feliz da vida, fez a pergunta do juízo final:

-Quer dizer então que o senhor é o Ney bom?

            E esta pergunta continua no ar até hoje, vagando e navegando na cabeça de cada amante da oitava arte. Na dúvida, prefiro chamá-lo pelo simples nome de Ney.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012



Projeto 2013 de Locura


            Começaremos 2013 trazendo de volta o ídolo da nossa geração. Algumas semanas já nos foram suficientes para que nós, pobres orfeões, quiséssemos seu retorno. Chega dessa distância. Nós queremos o Loco de volta. Nós merecemos. Ele merece. Esse time está muito educado e perfumado pro nosso gosto. Ninguém reclama com o juiz, ninguém bate no adversário, ninguém xinga os rivais. Fica apenas naquela coisa trivial de achar que um campo de futebol e uma audiência da ONU são as mesmas coisas. Queremos o louvor da loucura indomável que a tantos incomoda. A volta da locura que nunca deveríamos ter abandonado.

            O Sidão é um grande jogador, sem dúvidas. Porém, quando perde uma bola ou erra algum lance, o narrador fala que “é, mas isso não é o normal dele”. Quando o Loco perde uma bola, eles disparam que “esse é o Loco. Bom da cabeça e ruim do pé”.  Sim, eu prefiro o segundo personagem. Não quero ninguém no meu time que seja unânime. E ele voltará nos braços da torcida. Esta mesma torcida que está impaciente com o Faraó Turco, mesmo o Amaldiçoado sendo o problema. Nós esperávamos um reposicionamento à altura, óbvio. Mas o Faraó Turco ainda não teve tempo de nos mostrar sua lucidez, característica simbólica destes seres. E quando atuou, achei melhor que o Elke Maravilha. Essa torcida já foi melhor.

            Aliás, outra mudança que se faz necessária é o fim da Raiva, que por pura falta de conhecimento linguístico, é chamada de Fúria. Não estou pedindo o fim desta por meios policias ou legislativos. Sou a favor de os torcedores de paz quebrarem a cara deles e dar um basta nesse câncer alvinegro. Eles não são botafoguenses. Muito menos Botafogo. Estão lá para se auto-promoverem; E quando têm oportunidade, matar os adversários. Meus caros, isso só mancha nossa imagem. Eu sei que deve ser legal estar lá no meio da gritaria, achando, mesmo que temporária-ilusoriamente, que está fazendo alguma mudança no mundo. Mas não. Você não está sendo bonitinho e nem está mudando nada. O Botafogo faz gol e eles gritam “Raiva, Raiva”. Que isso? Apoio? Narcisismo? Nada?

            Flamengo e Fluminense terão autorização a apenas um jogo por mês em nosso estádio, mais os clássicos. Pouco me interessa se poderão jogar no aterro ou não. Este problema não é meu. O tapete do Grande Engenho era excelente até o Willians começar a jogar lá. Seus carrinhos e botinadas criaram relevos irreparáveis. E agora nós tivemos que importar uma aparelhagem da Holanda para tentar não deixá-lo tão ruim. E cadê a contribuição dele? Ele também deveria pagar pelo concerto. E não preciso dar explicação para não querer o Fluminense na minha casa. Assim como qualquer mulher, eles vão querer ficar discutindo a relação até o término. Pois bem, termino já agora.

Outra necessidade é a mudança de nome do Grande Engenho. João Avalanche não merece nenhuma homenagem que parta da gente. A única coisa que talvez eu apóie é a compra de seu caixão. De papelão. O nome do estádio tem que ser João Saldanha. Tem que ser. Não tem opção. Caso a prefeitura diga que não mudará, convoco vocês, desde já, a ocuparem o Grande Engenho. Faremos de conta que estamos lá simplesmente para ver algum jogo. Quando este acabar, ninguém sai do estádio até a mudança de nomenclatura. Levem barracas e suprimentos alimentícios, está batalha poderá demorar. E não se assustem com qualquer represália policial, nós ainda seremos maioria. Não estou incitando a violência, mas se eles começarem, eu vos autorizo a perder a razão. A Locura voltará a enfeitiçar nosso clube. O clube de capa e espada também será o clube de insanidade.

sexta-feira, 20 de julho de 2012



Neal Cassady era Botafogo

           
            Tive, ontem, o raro prazer de assistir um sonho realizado. Vi alguns dos meus ídolos reencarnados, por mais que tenha sido de forma mandrake. Puseram um Kerouac parecido com Harry Potter, um Ginsberg pré-puberdade e um Cassady loiro de olhos claros, usando perfume e de dente escovado. Mas tudo isso, com o passar do filme, tornou-se irrelevantes. A admiração que tenho por este grupo e, especificamente, pela obra do Jack, deixou-me em êxtase.
           
On The Road marcou minha vida como poucos livros; E um filme que demorou décadas para ser produzido e lançado, pelo rancor de não chegar aos pés do homônimo, não poderia ser desprezível. Como qualquer bom botafoguense, não esperava sair da sala podendo falar: “Vejam este filme”. Mas assim o fiz.
           
Não é um filme perfeito. Achei o Walter Salles precoce em alguns cortes e faltou explorar melhor a estrada em si, porém admirei o fato de não se limitar somente ao On The Road, pegando passagens de outros livros, visando uma maior compreensão, para leigos, do que foi aquela geração. Não sou o tipo de babaca que pensa que conhecimento deva ser limitado a alguns. Todos devem ter oportunidade de compreensão. Sei também que nem todos compreenderão, e de certa forma, essa constatação me alenta.
           
Uma das coisas que mais me receava com relação a filmarem de uma obra kerouaciana era o fato de transformar aquilo em uma simples história. E, como qualquer bom escoteiro, bati com a cara na parede mais uma vez. O filme, em certos momentos, tenta fugir disto. Em vão. E não foi somente desta vez. Qualquer obra literária que tenta ser passada pro cinema tende a sofrer deste mal. Tende.
           
Uma das coisas que aprendi com seus livros foi exatamente esta: A felicidade e a qualidade de qualquer existência não estão na chegada, na conclusão, mas sim no caminho, nas entre linhas. Porém, meus caros, garanto-lhes que isto nunca será feito, primordialmente, com uma obra de Jack Kerouac.

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            Nas obras deste, é impossível não se apegar ao Neal Cassady. O Jack sempre fez o papel de transmissor, enquanto o Cassady era o personagem em voga. Vagabundo, sem medo, ladrão, ilimitadamente humano e sincero, são qualidades presentes nesse “personagem”, mas que não chegam nem perto de serem capazes de suprir todos suas características. Reza a lenda que além de Ginsberg ser apaixonado por ele, Kerouac também o era. Não por menos, quando soube da morte de seu amigo, foi-se junto alguns dias após.
           

Observamos que, em uma época de seres tão honestos e ativos, todos sofriam com Cassady a mesma coisa que o Rei Midas  sofria com o ouro. Ambos completavam, até mesmo de forma compulsiva, a vida alheia. Algo parecido com o contato de qualquer ser humano com a saga alvinegra. È impossível alguém, disposto a aprender, ter contato com esta entidade e não se apaixonar. Nós não torcemos pro time da moda, não torcemos pro time com mais títulos e, muito menos, pro de maior torcida; Torcemos pro time com mais historias para contar. Portanto, proclamo desde já:
           
O Botafogo é Literatura. E sem a literatura futebolística no mundo, a Copa já seria disputada no pebolim. E afirmo, por essas e outras, que o Casady, ser intelectualmente avançado e consciente de seu lugar no mundo, era Botafogo. Sem dúvidas.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Uma pausa criativa para dar lugar a um terceiro que escreveu algo que penso ser relevante. Afinal de contas, o Blog Carlitiano também tem a intenção de lançar novos comentaristas. Este de hoje escreve em um jornal institucional, que tem a prepotência de se chamar O Globo, e espero que este blog, visitado por quase três pessoas semanalmente, consiga alavancar sua careira. Boa leitura.



Um novo patrono para o Engenhão 

Elio Gaspari, O Globo. 18/07/12


“A cada dia que passa e o estádio olímpico do Engenhão continua com o nome de João Havelange, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, confirma as palavras dos advogados da Fifa no processo que tratou do capilé de US$ 14 milhões recebidos pelo doutor e por Ricardo Teixeira: “Pagamentos de subornos pertencem ao salário recorrente da maioria da população na América Latina e na África.”

Havelange e Teixeira receberam, mas a galera que vai aos estádios e elege prefeitos leva a fama. A exposição da malfeitoria, treze anos depois das primeiras denúncias, mostra que os subornos, quando rolam no andar de cima, são protegidos por um sistema de salvaguardas especiais. No caso da dupla, a blindagem funcionou na própria Suíça, pois as principais acusações surgiram em 2006. Havelange foi protegido ao limite do possível. Ele dirigiu a Confederação Brasileira de Desportos de 1956 a 1974, e a Fifa de 1974 a 1998, quando foi aclamado seu presidente honorário, título que ainda mantém. Afora isso, foi membro do Comitê Olímpico Internacional e fez Ricardo Teixeira, que era seu genro, presidente da Confederação Brasileira de Futebol. Os dois saíram de fininho no ano passado, quando a magistratura suíça já estava atrás de suas contas.

Aos 96 anos, Havelange ensinou: “Difícil na vida não é chegar, é saber sair. Tem que sair bem.” Ele construiu seu verbete na história do esporte brasileiro e destruiu-o na saída. Charmeur irresistível e grosseirão inesquecível, “nosso querido Havelange” (nas palavras de Lula), encantou governantes e ajudou atletas colocando-se ora como patriarca onipotente, ora como cortesão maltratado. Quando Pelé contrariou-o, disse: “Dei todas as atenções e fiz gentilezas a esse moço.” No ano passado, a doutora Dilma tomou-lhe o passaporte diplomático e ele lamentou-se: “Eu merecia isso? É isso que dói, este é o meu país.”

Havelange e Teixeira encarnaram a transformação do futebol num empreendimento bilionário. Em 1958, quando o ex-sogrão trouxe a primeira Copa do Mundo para o Brasil, o goleiro Gilmar ganhou uma bibicleta e um terno. Hoje os craques pilotam Ferraris. Há patrocinadores para atletas, clubes, seleções e Copas, e, se isso ajudou a profissionalizar o esporte, serviu também para montar propinodutos e lavanderias de dinheiro. A rede de interesses criada pelo progresso deu à cartolagem oportunidades para a delinquência e fez da Fifa uma central de negócios, ramificada em donatarias nacionais.

A presença da empreiteira Delta na construção de estádios para a Copa de 2014 é um solene indicador dos perigos que rondam a festa. Até bem pouco tempo Joseph Blatter, presidente da Fifa (secretário-geral ao tempo de Havelange), comportava-se nas negociações com o Brasil como se fosse um chefe de Estado, manipulando a síndrome de “vira-latas” dos burocratas com quem tratava.

O ocaso de Havelange deveria levar o prefeito Eduardo Paes a aceitar uma disputa com a Fifa. Ganhará quem chegar primeiro: os cartolas suíços extinguindo a presidência honorária da instituição ou o doutor, trocando o nome do Engenhão.

Se o prefeito entregar a escolha do nome do estádio à galera que o frequenta, mostrará que “pagamentos de subornos” não “pertencem ao salário recorrente da maioria da população” do Rio.”

sexta-feira, 13 de julho de 2012



Morte aos Déspotas!


Acabamos de completar oito rodadas no campeonato nacional e ainda não tivemos, sequer, um jogo de arbitragem imparcial. E digo isso sem pesar algum. Nós escolhemos o clube que sofre de forças externas, pois gostamos de comprovações materiais de que o mundo não é justo. Não é certo. E funciona de um modo pré-fabricado, gostem ou não. Qualquer coisa que fuja do normal e do aceitável está com fadado à desgraça. Estava.

Nós temos alguns trunfos. Somos folgados o suficiente para querer que o mundo inteiro saiba da merda aonde pisa. Botafoguense sempre foi catastrófico ao ponto de elevar o erro de um juiz ao patamar de atentado terrorista na mesma velocidade em que o comentarista esportivo alega sua opinião.

-É, realmente houve um soco, seguido de um tiro na região abdominal e o lançamento de uma granada. Mas concordo com o juiz, não marcaria falta.

Após anos sofrendo com o poder monárquico, trabalhando em feudos elitistas e perigando passar fome, aviso aos ouvintes misericordiosos: A revolução começou. Os jovens estão chegando ao poder para acabar com esta zona de injustiças e julgamentos precoces. Os velhos mandatários atuais não entendem palavras como futuro, felicidade, liberdade e arte. A solução? Guilhotina.

E o começo foi esplendoroso. Começamos a revolução com uma festa. Digo desde já, uma festa há muito não vista no grande engenho, quiçá desde os tempos das rodas capoeiristas. Uma guerra que se inicia de tal forma, tenho certeza, não está fadado ao fracasso. Credito a primeira vitória ao reencontro de um pai e um filho. Nada como uma relação familiar presencial para aflorar tais anseios de mudança.

Sendo assim, O Pequeno Alcides entrou em campo sem dar valor aos salários ou holofotes; Queria apenas provar ao pai que era suficientemente capaz de se divertir. E que diversão agradável de ser assistida. Mesmo sob injúria e má vontade do juizado de menores, que lhe tirou um tento sem motivos legais, não abaixou a cabeça e seguiu lutando. E, apesar dos chicotes e leões, continuou rindo e nos convencendo. E avassalando o adversário. Dois simples tiros certeiros foram convincentes para o prolongamento da festa.

Aí veio a tomada da Bastilha, vulga Pacaembu, poucos dias após. E aprendemos uma lição, de cara. Não podemos, dentro de uma revolução, renegar nenhum ser, mesmo que este tenha um passado pesaroso, mesmo que este esteja amaldiçoado. Os revolucionários de histórico duvidoso são os mais atuantes pelo simples fato que necessita, constantemente, provar seu valor.  Sim, ele continua precisando provar seu valor. Três credos em duas batalhas não fazem dele a salvação da bandeira. Ele nunca será a salvação de nada. No máximo, poderemos esbravejar sua redenção daqui a alguns meses.
           
E invoco, desde Danton e Marat até os anônimos de preto e branco, a participarem, domingo, da batalha chave. A revolução está apenas começando, porém nossos aliados, a juventude e os irreverentes guerrilheiros sem farda, alentam-nos sobre o possível enforcamento dos déspotas. Poderemos até perder a próxima batalha, mas a guerra continua. Tenho certeza de uma coisa: ganhando ou perdendo, o Maneco terminará o jogo mijando na cartola de nosso infeliz adversário, como nunca deixou de fazer. Assim na guerra, como na paz.

quarta-feira, 4 de julho de 2012




Do Paraguai até o Severo General
            
Pelos bares cariocas, muito se comenta a queda do bispo do poder paraguaio. Desde já, deixo clara minha opinião: sou contra qualquer bispo, de qualquer religião e de qualquer país, intrometido no poder político. Porém, minha insensatez nunca deixaria aprovar uma retirada desta forma. Os socialistas reacionários perguntarão: Mas que forma inescrupulosa é esta? E vos respondo: a forma paraguaia de viver. E, sobre qualquer julgamento precoce de difamação, defenderei que nós, brasileiros de força menor, nada somos além de um Paraguai latifundiário.

Porém, meus caros, se faz necessária uma diferenciação entre coisas importantes e secundárias. E posso afirmar, desde a semana passada, que têm coisas acontecendo em General Severiano muito mais severas que em nosso vizinho. Um golpe ideológico está acontecendo e ninguém se posiciona. Eu poderia afirmar que é um crime contra a cultura latino-americana. Um crime contra a integração e o intercâmbio entre os povos. Um crime oriundo do quarto poder, que defendíamos com Lancelotes e  D´Artagnans, sob as tutelas de Don Quixote e do Manequinho. No entanto, a ingrata visita da realidade veio atormentar-nos novamente. E os nossos representantes administrativos não entendem mais o significado da palavra Botafogo. O baque foi irreversível.

Desde a sua chegada, uma pergunta tirou-me dias de sossego. Porque o Loco incomoda tanta gente? E, dentro desses dois anos e meio, analisei diversas respostas. A loucura tira a calma das pessoas normais. A loucura cria inveja. A loucura é incompreensível. A loucura põe o cotidiano no bolso e sai para tomar uma cachaça. E, por fim, a loucura é contagiosa. Vejam que com apenas dois meses de casa, ele já tinha convertido uma multidão a beijar seus pés e a gritar seu nome. A loucura dominou o Rio de Janeiro de tal forma, que mesmo Erasmo de Roterdã sentiria necessidade de reescrever sua obra prima. Uma pessoa sã não tem esse poder. Jesus Cristo esperou trinta e três anos para ter tal capacidade de convencimento e, mesmo assim, sua existência continua contestada. Enquanto o Loco, sem precisar transformar água em vinho, convenceu-nos de sua soberania; Deixando para os ganenses e para seus adjacentes, apenas uma singela cavadinha de brinde.

Já o Herrera, aceitei-o em meu time por todo esse tempo por dois motivos: A sua simplesmente aterrorizadora cara de maluco e por ser argentino. Argentino não faz gol para poder dançar no Faustão ou pedir música em boate. Eles entendem futebol além da normalidade profissional e fantasiosa. Eles jogam porque gostam. Vejam o Messi, que mesmo não querendo, continua com o sangue azul. Nunca o vi comemorar um gol dançando tango. E agradeço enormemente por isso. E o nosso argentino ia ainda mais além. Não só deixava de dançar, como também ia para cima do juiz. Ele sabia, no fundo de seu âmago, que um gol não redimiria seus outros oitenta e nove minutos em campo. Sabia que um gol não iria acabar com a pobreza do mundo. Sabia que um gol não iria devolver um bispo ao seu lugar de origem e, muito menos, da forma adequada.

Por essas e outras que, como um bom latino-americano que penso ser, só tenho a agradecer. Loco e Herrera, vocês marcaram minha geração de botafoguenses. Garanto-lhes que as portas de General Severiano estarão sempre abertas a vocês, quer os outros queiram, quer não. Até Lugo. Até logo. Hasta luego.

sexta-feira, 29 de junho de 2012



A Despedida do Mago Manco

            Todos nós, alvinegros de força convicta, sabemos das dificuldades de vivenciar certos sonhos. Sempre que tal sensação nos aflige, torcemos, imediatamente, por um banho de água fria. Retirantes das nove e retumbantes das três, não nos iludimos com esmolas generosas. Tão pouco somos santos.
           
Somos humanos muito mais humildes e poderosos que estes. Santidade é coisa para os fracos, que mesmo após a morte, insistem em querer a auto-afirmação à custa alheia. Preferimos o sutil prazer de aterrorizar o cotidiano dos outros, estando vivo ou não.
           
Porém, nem todo ser ultrajante e arrogante como um bom botafoguense, sabe de suas limitações. E como um bom professor primário, não estou aqui para ensinar coisa alguma. Apenas quero revelar a importância de certos delírios. Entendam certas como raras.
           
Em 2009, após dois anos de roubos indecorosos e descarados, recebemos diretamente de algum lugar da idade média, um ser suntuoso. Seu nome, que de tão brasileiro acabou adotando tons irônicos, nos agradou, mas preferimos coroá-lo precocemente mago de nosso reino. E antes que pudéssemos considerá-lo humano, profetizamos que este era digno de nos salvar. Desculpem-me senhores, mas nossa salvação nunca veio da noite para o dia. Nunca. A nossa salvação sempre veio, exatamente, de forma oposta ao que as grandes corporações religiosas ditam.
           
Sendo assim, em seu último jogo pelo Botafogo daquele ano, tomou três tiros em dez minutos e machucou-se. O nome do inquisidor: Willians. E mesmo com toda a magia que pensávamos que o nosso salvador tinha, foi-se manco. Um ano e meio depois, retornou ao nosso reino. E mesmo manco, continuamos acreditando nele. Em vão.
        
E agora, Maicosuel vai nos deixar orfeões pela segunda vez. A junção da ciência com a igreja se aproxima, mago manco e o inquisidor assassino jogarão pelo mesmo time; E mantenho minhas dúvidas com relação as severas consequências de tal afronta. Mas não se apavorem, meus caros. Temos em nosso elenco um ser capaz de entender os sofrimentos de um órfão. John Lennon está conosco. E posso garantir-lhes, deliciando-me em suaves delírios, que este reviverá anos de glorias ao lado de Creedence Seedorf.

segunda-feira, 25 de junho de 2012



A Itália Botafoguense


            Podem duvidar, falar que é locura ou utilizar qualquer outra argumentação infalível, mas afirmo desde então que a Itália aprendeu muito com o Botafogo. Não só aprendeu, como agora cisma em querer imitar-nos, da forma mais plagiosa possível. Vide a cavadinho do Pirlo. Essa ligação da Itália com conquistas improváveis e o desprezo por campeonatos fácies tem uma origem. Arrisco dizer que sem o Botafogo, a Itália não teria história no futebol. Não teria referência.
           
O italiano, por natureza, é aquele ser que gosta de ser xingado. Ele não sente estímulos na vida sem ao menos ouvir sua mãe ser convocada para trabalhar no cabaré mais próximo. Em outras culturas, este tipo de declaração é uma afronta. “Mete a minha mãe no meio que eu meto no meio da tua”, diria o transtornado em crises existências. Mas o italiano não. Ele utiliza de sua superioridade moral para seguir em frente. Como prova de tamanha ignorância puritana, Benito Berlusconi é ídolo na Itália. Só na Itália.
           
Da política ao futebol, é um pulo. Ao menos para nós. Italianos, assim como botafoguense, acham que as duas coisas andam juntas. Todo ano algum jogo do Botafogo é adiado por conta de seu rival. Se o adversário não pode comparecer ao compromisso, W.O. Às vezes me pego pensando: A CBF é um órgão político que trata de futebol? A CBF é um órgão futebolístico que não trata de nada? A CBF é um órgão ou uma simplória espécie de câncer? Admito que qualquer resposta não me será satisfatória.
           
Em 2006, à véspera da Copa, o campeonato italiano revelou suas propriedades travessas. E os comentaristas vespertinos e prematuros analisavam o futuro fracasso da azurra. Conseqüência? O título mundial. Meus caros, não caiam dessa balela moralista assustadoramente evangélica que esse pessoal proclama. Manipulação de resultado tem em qualquer lugar. E é exatamente nesse ambiente pessimista que nós nos criamos. O péssimo é sempre mais atraente que o ótimo. Tragédias são muito mais emocionantes do que as comédias. Sem o Botafogo no mundo, a Itália sucumbiria a tais injurias e perderia. Nós estamos no mundo por um único motivo: Acabar com a falsa felicidade alheia. Não por menos, quando um jogador dá algum drible desconhecido por lá, eles profanam: “À lá Garrincha”.
           
            Ontem, perdemos para a Macaca no Grande Engenho. Eu acharia vergonhoso ganhar de um time com este apelido. Acordei hoje e fui à padaria tomar um café. No meio do meu pacifico primeiro cigarro, Seu Manoel ameaça uma provocação:

            -Que derrota ontem, hein? – e começou a contar-me como foi o jogo, achando que eu não havia assistido. Afinal de contas, eu tinha tudo para estar possesso, mas estava ali, em uma calma quase que contagiante – Aí, o jogador ficou na cara do gol e chutou. 2 a 1. E o Botafogo...

            -Calma, Seu Joaquim – interrompi apagando o cigarro - Primeiro, não pronuncie esse nome em vão. E segundo, o senhor já ouviu as expressões piedade e “azar de campeão”?

terça-feira, 19 de junho de 2012





Quando Os Bravos Fogem, Os Covardes Vão Embora

A espera está demorada e apesar de todas as impossibilidades que sempre nos agradaram, nós continuamos aqui, à sua disposição. Notícias e previsões pouco condizentes estão batendo em nossas portas semanalmente, há anos. Mas não podemos negar, conforme o tempo passa, está demora se transforma, cada vez mais, em algo magnificamente colossal.
           
Não é de hoje que nós gostamos de suspenses. Aliás, em qualquer instância, nada para qualquer botafoguense é de hoje. Temos o prazer incomum de poder comparar tudo com alguma coisa do passado. Este dom é raro, e de extremo perigo social. O risco de fecharmo-nos em análises pouco comprobatórias para os demais, assola-os da mesma forma em que uma frágil presa sente medo do perfume de seus concorrentes alimentícios.
           
Mas não podemos, jamais, iludir-nos com a ignorância alheia. E, com um toque de paciência, veremos que a melhor solução para tais conversas é a fuga. “Ora pois, mas fugir nunca foi uma opção coerente”, diria o português da esquina. Pois bem, fuja dele também. Os outros só servem para atrasar nossas próprias conclusões.
           
Sendo assim, em 1911, ano mais importante da história do futebol carioca, o quadro de sócios alvinegro diminuiu quase pela metade. O motivo? A fuga de nossos corajosos patronos. Eles fugiram da arrogância dos ricos. Fugiram da argumentação conservadora dos bigodudos. Fugiram das mentiras entrelaçadas nos discursos altruístas. Sempre as mentiras. E, como não havia de ser diferente, todos os imbecis foram embora. Não por rebeldia, mas por falta de compreensão. Assim feito, os trezentos remanescentes formaram o verdadeiro Botafogo. E a partir disto, construímos nossas próprias características, tão peculiares e temidas.

Conforme o tempo passa, mais sinto necessidade de outra transformação desse nível. O Botafogo nunca foi um clube condizente com a massa. Nossos times nunca souberam jogar em estádios lotados. E que arremessem paralelepípedos aqueles que discordem. Botafoguense não entra em discussão, declara guerra. Botafoguense não pede apoio, se desespera com palavras como esperança e solidariedade. Botafoguense não busca mudar o mundo, ao menos não antes de achar sua própria salvação.

Por essas e outras que nós, integrantes de uma espécie que deveria estar em extinção, proclamamos:

“O último reduto underground voltará à força máxima. E todas nossas noites mal dormidas se virarão contra vocês, ordinários carentes e solidários; assim nas trevas, como no céu!”

terça-feira, 12 de junho de 2012

Victor Junior, O Adicto

Após meses sem algum ser impreterivelmente convencido de que sua vida se resumia as suas tentações, o caminho da luz reapareceu. E esse tal de Victor Junior demonstra com perfeição o que é ser viciado no objeto de trabalho. Para se ter uma idéia, ele não consegue ficar quieto em bancos de reservas. Ele foge, misteriosamente, de seus companheiros, e quando menos se espera, lá está ele. Trabalhando como gandula.


Esta fixação, que tomarei a liberdade de chamar vício, no entanto está aquém de julgamentos pretensiosos. Ninguém poderá dizer, com absoluta convicção, que obsessão é um defeito. E levando a vida como qualquer outro mortal, ele não aguenta de ciúmes ver a pelota com outro. Ela lhe pertence. Ao menos em seu âmago. E este sentimento é louvável. Porém, quando a tem, não sabe muito bem o que fazer, de tamanho ecstasy. Traz ela pra cá, ela vai pra lá. Chama-a de querida, e esta corre para a lateral. Ele persiste como qualquer pedinte de lanchonete e, hora ou outra, ela volta. Assim, gruda nela como o mel lambuza o urso. E um segue com medo do outro.

Com tamanha empolgação, entrou em campo domingo procurando a coitada. Não tardou a achá-la.

Primeiro gostaria de dizer que é inadmissível O Glorioso perder para o Náutico. E digo isso sem pretensão de limitação. O Botafogo não pode perder para um time com este nome, em quaisquer circunstâncias. E mais, em qualquer esporte.
           
Mas, ainda precisávamos da confirmação. E o lance do terceiro gol adversário foi esplendorosamente saudável pra este time. Ele, navegando na pura ingenuidade de um bravo guerreiro pré-histórico, acredita que todos a sua volta vêem o mundo da mesma forma. Pensando, ou não, que nosso terceiro goleiro era aficionado como ele, recua uma bola arriscada. Ora pois, um atleta que perde a vida sendo terceiro goleiro não pode querer descer ao reino dos viciados. Gol. A ilusão de igualdade sentimental é algo que apenas os neuróticos conseguem ter. E, sendo, culpa dele, nada mais me resta, a não ser um bem-vindo.

Observando um pouco mais severamente a jogada, está foi a prova que nos faltava. É ele. O vagabundo que nós, Botafoguenses, temos orgulho de hospedar. Após meses de solidão, o nosso time volta a ter um elenco característico. O nosso time nunca, e repito, nunca, conseguiu alguma coisa sem ter ao menos um viciado no elenco.

segunda-feira, 11 de junho de 2012


Elkeson, O Desgraçado

            Nunca acreditemos naquilo que vêm de formação inescrupulosa. Qualquer gênero de ser que tenta burlar certas conseqüências contra si mesmo, hora ou outra, acaba rompendo o silêncio da calmaria. E, sobre tais afirmações, pergunto: Seria Elkeson tão certo de si? E sem pudor ou cinismo, respondo: Ele está amaldiçoado.

            Apenas a tentativa de fazer coincidir terríveis acontecimentos com algum ser amaldiçoado, está fadado ao perigo da sabedoria. Alguns se sentem corajosamente capazes de investigar, outros preferem o conforto de suas poltronas 2000. Mas acreditem, este caso superou todas as expectativas otimistas e bonitinhas. Este filisteu futebolístico está sendo amaldiçoado por, ninguém menos, do que Deus. E garanto-lhes, o Botafogo nunca foi lugar de pessoas esclarecidas. A dúvida paira em nossas cabeças como urubus pousam sobre as carniças. Observe as primeiras palavras proclamadas por este sujeito, assim que pisou no terreno errado pela primeira vez na vida:

            “-Felizmente, deu tudo certo. Agora, quero mostrar meu futebol e fazer o meu melhor pelo clube.”

      Fugindo da normalidade das falas improvisadas dias antes pelo empresário, deu sua primeira demonstração de perigo. Fez-nos acreditar que o seu melhor nos era suficiente. E nós, fanáticos alucinados navegando em direção ao abismo, pedimos socorro a nossa última esperança. Em vão.  No exato momento em que qualquer das mais singelas incógnitas foge da cabeça de algum Botafoguense, podem ter certeza. Nem tudo vai sair bem. Ou, mais seriamente, quase nada sairá nos conformes. Não tardou, o dia escureceu. Porém, apenas quando a maré abaixa podemos analisar o estrago. Antes tarde do que nunca.

       E assim, fui hoje convocado para assistir Botafogo e Cruzeiro. Entrei no Grande Engenho mais moderno do mundo sem preocupações. Sabia apenas que alguma coisa de sobrenatural iria acontecer, e como qualquer bom acionista, compareci. Só não esperava tanto.

         Tudo seguia na mesma ternura afável de qualquer jogo alvinegro. Juizes claramente mal-intencionados, a fúria divina e a torcida tuberculosamente desnecessária e maléfica. Até que em meados do segundo tempo, olho, magneticamente, para o banco de reservas. Instantaneamente, o técnico chama ele, o desgraçado. E a torcida, após o delay natural, aplaude. Sem saber o significado de tal ato, e muito menos com vontade de entendê-lo, observei o primeiro, dos três raios cósmicos. Gol do oponente. Continuo a observar o andar daquele bicéfalo em direção à placa de substituição. Pisa em campo. E antes de pensar em respirar, Outro Gol. Toca pela primeira vez na temida. Virada benzida.

        A partir deste tipo de decorrência, passamos a questionar-nos sobre tais poderes divinos. Devemos orgulhar-nos de tê-lo na equipe, um ser maravilhosamente querido pelos adversários e com uma predestinação destruidora invejável? A Solução resume-se em uma palavra. Síria. Aproveitando a brecha das fortes orações, talvez ele pudesse achar a salvação da humanidade passando alguns verões lá.